Ontem tive que fazer uso de toda a minha pedagogia infantil com a minha afilhada que adquiriu o hábito de roer as unhas. Depois de muitos “e eu não quero saber”, “mas eu gosto”, “isso não me interessa”, “não venhas”, “também não quero”, tive um vislumbre de um brilhozinho nos seus olhos ao ver o meu lip gloss. Ataquei com tudo: chantagem. Selamos contrato com um oficial aperto de mão.
Embora ela me parecesse convicta, não me parece que o vá conseguir cumprir. A ver, vamos. Pelo sim, pelo não, vou comprar também um verniz anti-roedores.

Hoje deparo-me com uma situação mais delicada. Não creio que vá lá com lip gloss. A minha prima D..

No tempo em que era muito difícil lidar comigo e a meio de (mais) uma atribulada discussão, uma vez, a minha mãe, que é vate, desejou que se um dia eu tivesse uma filha, ela fosse igualzinha a mim. Como não tenho filhos (ainda!), tenho uma prima. Eu não acredito muito nessas coisas dos signos, mas a verdade é que nós – ambas aquarianas – somos, na nossa essência, iguais. A maneira de encarar a vida, a garra de lutar por aquilo que se acredita, o inconformismo, a rebeldia, a ousadia, a coragem. Muitas vezes dou por mim a ouvi-la falar e a pensar onde foi que me perdi. A capacidade que ela tem de deixar especada uma sala inteira de adultos a ouvi-la falar, tal é a paixão que transmite. E esperam que eu apazigúe essa vontade. Eu não vou ser capaz. Nem quero ser. Tal como não admito que me digam como viver a minha vida, sei que ela não vai admitir tais conselhos. Nem eu teria coragem de os dar. Se eu sou a primeira a achar que ela deve achar o seu próprio caminho e segui-lo incondicionalmente. Relutantemente, assenti falar com ela mas vai ser uma conversa de primas-manas. Não esperem que seja eu a cortar-lhe as asas. A vida madrasta vai encarregar-se disso a seu tempo, infelizmente. Eu curo, não corto.
Aqui entre nós, que ninguém nos ouve, a D. é o orgulho da prima mais velha.